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A família faz a mediação entre a sociedade e o indivíduo. Ela possui lógica própria, limitações de tempo e espaço e uma mitologia que se adaptam a condições socioeconômicas variáveis. Por outro lado, as sociedades ocidentais contemporâneas são famosas pela capacidade de integrar novas práticas culturais, inclusive aquelas originalmente opostas às normas dominantes. A família também é, obviamente, um locus de relações de gênero. O aparecimento da guarda compartilhada como prática contracultural ressaltou a normalização da separação conjugal e do divórcio, assim como o desejo de criar os filhos de acordo com papéis de gênero antes simétricos do que diferenciados. No Quebec, a guarda compartilhada de alguma forma se transformou em modelo para a igualdade de gênero, influenciando os papéis parentais e as relações entre homens e mulheres mesmo em famílias intactas. Mas será que o surgimento da guarda compartilhada como modelo cultural significa uma redução das desigualdades de gênero no interior da família? O presente artigo analisará as novas transformações dos papéis parentais heterossexuais com base nos dados empíricos de uma pesquisa no Quebec (Côté, 2000; 2004; 2006; 2010; 2012). O novo modelo da família baseado numa idealização da guarda compartilhada integra os conceitos contemporâneos da família como um grupo de indivíduos unidos por escolha e negociação, e não por casamento e dever. Ele também acomoda recentes evoluções de gênero: fluidez de identidades e papéis, pluralidade de experiências e maior mobilidade para as mulheres. No entanto, ao contrário de mitos comuns, essa modernização do espaço doméstico baseada na simetria dos papéis parentais e de gênero também cria novos tipos de regulamentações e constrangimentos que perpetuam e “modernizam” desigualdades. É o que será aqui apresentado e discutido.